sábado, 5 de dezembro de 2009

A mãe de todas as bolhas?
Ouro, petróleo, moedas de países emergentes, títulos da dívida iraquiana, apartamentos em Hong Kong -- tudo se valoriza na euforia que toma conta do mercado financeiro mundial.

(3 de 3)- Exame - Por Tiago Lethbridge, de Nova York | 26.11.2009 | 00h01


Uma análise mais detalhada coloca a suposta bolha chinesa em xeque. Os atuais múltiplos da bolsa de Xangai são, realmente, colossais na comparação com os outros países: 24 vezes. Parece muito, mas é pouco se for comparado com a história da própria China. Há dois anos, as ações eram negociadas a um múltiplo de 70 vezes, e a média histórica é de 37 vezes. Finalmente, o mercado imobiliário também não está tão aquecido quanto parece. Apesar da valorização dos últimos trimestres, o índice nacional de preços de casas subiu apenas 2% de um ano para cá, desempenho muito inferior ao ritmo de pelo menos 6% ao ano de 2004 a 2007. Mais uma vez, o que explica a subida atual é a descida em razão da crise do ano passado. "A bolsa e o mercado imobiliário estão se valorizando muito rápido, mas ainda não chegaram ao nível de um ano atrás", diz Andy Rothman, especialista em mercado chinês da corretora CLSA.

Mesmo que a bolha assassina descrita por Roubini e seus seguidores ainda não exista, o risco de que algo parecido com ela ganhe forma nos próximos meses é considerável. Afinal de contas, a política monetária nos países ricos continuará frouxa a perder de vista. O presidente do Fed, Ben Bernanke, já avisou que as taxas de juro nos Estados Unidos continuarão próximas de zero por um longo período. Com a economia americana capengando e o nível de desemprego superando os 10%, essa não é mesmo a melhor hora de mexer nos juros. E as pífias taxas de retorno no maior mercado do mundo serão um poderoso incentivo à busca de alternativas de investimento em outros mercados. Segundo o Instituto de Finanças Internacionais, o fluxo de dólares para mercados emergentes deve passar de 348 para 671 bilhões de dólares em 2010. "Os países emergentes estão liderando a retomada da economia mundial", diz Philip Suttle, economista-chefe do instituto. "O capital, que busca crescimento, está indo para onde tem de ir." Finalmente, os emergentes devem começar a subir seus juros antes dos países ricos, já que a retomada econômica está vindo mais cedo. Isso os tornará ainda mais atraentes para investidores estrangeiros. "O risco de distorções daqui para a frente é real", diz Suttle. A história mostra que a reversão de períodos de euforia tende a ser traumática, e país nenhum quer ser protagonista de um espetáculo desses. O governo chinês, por exemplo, já está diminuindo o nível de estímulo à economia -- o crescimento do crédito deve baixar dos 34% atuais para 20% até o fim do ano. "Para evitar um possível superaquecimento, o governo deve permitir a valorização do yuan já no primeiro semestre de 2010", diz Daniel Tenengauzer, chefe de pesquisa para mercados emergentes do Bank of America Merrill Lynch.

Para o banco central de países ricos, o surgimento de uma nova bolha mundial representa um dilema e tanto. Sob o comando de Alan Greenspan e Ben Bernanke, o Fed lavou as mãos para a bolha imobiliária americana -- para eles, cabia ao mercado julgar se os preços estavam ou não corretos. Não há, até agora, sinais de que o Fed esteja preocupado com o preço dos ativos. Pelo contrário. A queda do dólar e a valorização das bolsas parecem agradar a Bernanke. "Isso tudo ajuda a estimular a economia americana, que é sua grande preocupação", diz o economista Alan Meltzer, o mais renomado estudioso do Fed. Mas o que ele fará caso os preços entrem numa trajetória irracional de alta? Em novembro, Bernanke classificou esse dilema como o maior problema de política monetária desta década. A dúvida, sempre, é: como esvaziar uma bolha sem atrapalhar a recuperação da economia? "A situação da economia global ainda é muito frágil", diz Brad DeLong, professor de economia da Universidade da Califórnia em Berkeley. Apesar do crescimento de 3,5% do último trimestre, ainda sobram dúvidas sobre a forma com que a economia americana reagirá ao fim dos programas de estímulo governamentais. O trauma causado pela queda do castelo de cartas do mercado imobiliário fez com que as bolhas entrassem no centro das preocupações do Fed. Mas tudo indica que Bernanke não vai começar a se preocupar com o surgimento de uma nova bolha até que a economia americana se recupere do estrago causado pela velha.

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