sexta-feira, 29 de maio de 2009

Cobertura indevassável

O Globo, Júlia Dias Carneiro, 28/mai/09

A sua casa dos sonhos pode estar à sua espera numa ilha paradisíaca em Angra dos Reis, num cantinho de serra em Itaipava, numa praia reclusa em Búzios ou numa cobertura escancarada para o mar do Leblon. O desafio é encontrá-la entre as infinitas ofertas do mercado imobiliário - ou pelo menos era. A abertura do escritório da Sotheby's International Realty no Rio chama a atenção para o florescente mercado imobiliário de alto luxo - o que os gringos gostam de chamar de high-end - em território nacional. Um mercado em que, se o céu é o limite, o patamar mínimo também fica lá em cima, seja em qual for o quesito: serviço, discrição, localização, exclusividade, vista, projeto arquitetônico e preços. Mesmo a concorrência é do mais alto nível. A Sotheby's Rio vai concorrer diretamente com a Christie's Great Estates, estendendo para cá a sadia disputa nutrida pelas duas casas de leilão há mais de 200 anos.

A Sotheby's Rio, aberta no fim de março passado, integra um projeto ambicioso da Sotheby's International Realty (SIR) para o Brasil: inaugurar oito escritórios regionais no país até 2010. Hoje, além de no Rio, a grife já tem franquias em São Paulo (onde está a matriz), Recife, Natal, João Pessoa e Campo Grande. Os franqueados são escolhidos pela empresa, que procura profissionais que se enquadrem em seu perfil. No Rio, o escritório recém-inaugurado no Shopping Leblon é dirigido por Ignácio Robles, que tem 30 anos de experiência no mercado imobiliário. Até junho, Robles espera reunir um portfólio de 200 imóveis de alto padrão.

Assim como a SIR, a Christie's Great Estates - braço imobiliário da casa de leilões Christie's - entrou no Brasil em 2007. Mas a empresa não trabalha com franquias, e sim com afiliadas: sua estratégia global é eleger imobiliárias líderes no mercado de alto padrão, aproveitando a expertise local de suas parceiras. No Brasil, as escolhidas foram a Judice & Araujo, no Rio, e a Coelho da Fonseca, em São Paulo, que desde 2007 fazem parte da rede mundial de afiliados com o selo de qualidade Christie's.

Nos dois casos, o prestígio e a credibilidade construídos ao longo de séculos pelas casas de leilão foram passados a suas subsidiárias no setor imobiliário.

- A Sotheby's criou seu departamento imobiliário há 30 anos, quando percebeu que também poderia trabalhar os imóveis desses clientes que eram grandes compradores de arte, móveis, antiguidades... - conta Ignácio Robles, da Sotheby's Rio. - É uma questão de grife.

Apesar de a matriz da SIR estar em São Paulo, a empresa considera o Rio a porta de entrada para os estrangeiros. Afinal, aqui estão alguns dos destinos mais cobiçados no país: Angra dos Reis, Búzios e a orla Ipanema-Leblon. Location, location, location... Esse é meio caminho andado no mercado de alto luxo. Mas, para um imóvel pertencer a esse nicho classe AAA, os pré-requisitos começam no preço. O valor de base trabalhado pela SIR no Brasil é de US$500 mil; semelhante ao da Christie's, que considera imóveis de alto padrão aqueles acima de R$1 milhão (no exterior, esse piso já pula para US$1 milhão). Depois do preço (e muito em função dele), vêm os atributos.

- O imóvel deve ter uma estrutura compatível com o alto padrão. Se for uma casa, deve ter vários quartos, cômodos espaçosos, um bom terreno... Se for cobertura, uma vista bonita e privacidade são fundamentais - exemplifica Patricia Judice de Araujo Esteves, diretora comercial da Judice & Araujo para a região serrana e Búzios.

A exclusividade também reside no projeto arquitetônico. Não raro os imóveis de alto padrão ostentam assinaturas de arquitetos de renome, como Cadas Abranches, Lia Siqueira e até o célebre Affonso Eduardo Reidy - a casa onde o autor do projeto do MAM viveu em Jacarepaguá está sendo vendida pela Sotheby's Rio, com direito a jardins projetados por Roberto Burle Marx. E quem são os clientes desses imóveis? A resposta vem genericamente: banqueiros, artistas, advogados, jogadores de futebol...

- O cliente de alto padrão, seja estrangeiro ou brasileiro, está preocupado com a privacidade - diz Patricia, que só revela nomes de alguns clientes que deram autorização expressa à afiliada da Christie's, entre eles Luciano Huck, Antonio Bernardo, Alberto de Orleans e Bragança, Maitê Proença e Zeca Grabowsky.

Estrangeiros também são parte importante da clientela, ainda que em menor proporção. Ignácio Robles, da Sotheby's Rio, estima que 80% dos negócios da empresa serão realizados com clientes locais, e apenas 20% com estrangeiros. Na Judice & Araujo, a procura de imóveis por estrangeiros vinha registrando um crescimento "espantoso", segundo Rodolfo Judice Araujo, diretor do escritório carioca - isso até setembro do ano passado.

- Depois da crise, os clientes estrangeiros travaram. Mas já estamos esperando uma retomada a partir desse mês - diz ele.

A crise prejudicou as vendas sobretudo no último trimestre de 2008. Mas, já nos primeiros quatro meses deste ano, os números da Judice & Araujo superaram o mesmo período do ano passado. Talvez por causa do crescimento vertiginoso que vem sendo registrado desde que a empresa virou afiliada da Christie's Great Estates.

- A empresa vem crescendo na faixa de 80% ao ano - diz ele, um dos membros da família que fundou a Judice & Araujo há 35 anos em Petrópolis.

A presença dos nomes da Christie's e da Sotheby's no Brasil também marca a inserção dos imóveis de alto padrão brasileiros na glamourosa rede internacional de propriedades high-end das duas empresas (a Christie's Great Estates tem 900 afiliados em 41 países; a Sotheby's International Realty, 540 escritórios em 39 países). Dos 500 maiores milionários do mundo, a Sotheby's calcula ter 440 entre seus clientes. E se acaso um deles procurar a Sotheby's de Nova York interessado em comprar uma casa em Angra, será encaminhado à equipe carioca, que lhe apontará as opções condizentes com seus desejos.

- Da mesma forma, se um carioca quiser comprar um imóvel em Aspen, Nova York ou Paris, em vez de ele ligar para fora, basta vir aqui que faremos todos os contatos por ele, e o representante da Sotheby's lá fora vai lhe apresentar todas as opções - assegura Ignácio Robles.

Patricia conta que um dos negócios mais interessantes que fechou este ano foi a venda de uma fazenda perto de Valença - a Santa Luzia, que pertencia ao jornalista Márcio Moreira Alves - para um advogado inglês que mora no Oriente Médio. Ele visitou o imóvel no carnaval e fechou o negócio poucas semanas depois, em março. Pagamento à vista, como ocorre na grande maioria dos casos:

- Essa porta internacional que a Christie's nos proporciona trouxe um cidadão inglês que mora em Dubai para comprar uma fazenda no interior do Rio de Janeiro. E isso é muito legal.

Nenhum comentário:

Postar um comentário