quarta-feira, 8 de julho de 2009

Juros, inflação e bolhas imobiliárias

Valor Econômico, Alex Ribeiro, 08/jul

O consenso formado nesta crise financeira mundial é que, para evitar o surgimento de novas bolhas, de agora em diante os bancos centrais devem prestar atenção nos preços dos ativos, como imóveis e ações, e não apenas nos índices tradicionais de inflação, que acompanham preços de bens e serviços. No Brasil, o tema, por enquanto, frequenta apenas as discussões teóricas do Banco Central, mas se percebe alguma simpatia entre os atuais dirigentes por ampliar o mandado da política monetária, incluindo a estabilidade financeira.

Se esse for o caminho escolhido, será necessário criar ferramentas adequadas. Um dos problemas é que não há informação abrangente e confiável sobre a evolução dos preços dos imóveis. Preocupado com essa lacuna, a autoridade monetária já havia determinado, mesmo antes da crise, que os bancos desenvolvessem um índice de preços de moradias que, ao mesmo tempo, tivesse cobertura nacional e revelasse nuances regionais.

O diagnóstico é que, hoje, não há desequilíbrios. Mas isso não quer dizer que a economia esteja imune. Por mais que se culpe os instrumentos derivativos tóxicos, o centro da crise mundial foram os anos de juros muito baixos nos Estados Unidos, que levaram à forte expansão do crédito habitacional e à supervalorização dos imóveis. No Brasil, temos juros baixos para nossos padrões históricos e expansão relativamente forte do crédito imobiliário. Se o mercado não for monitorado, teremos, no limite, a nossa própria bolha.

Nos 12 meses encerrados em maio, os financiamentos imobiliários cresceram 40,4%, o dobro da velocidade do crédito total, que avançou 20,5%. Há bons argumentos para se afirmar que, por enquanto, a expansão é sustentável. Em maio, o crédito imobiliário representava apenas 2,4% do Produto Interno Bruto (PIB), segundo dados do BC. Estamos bem abaixo do pico de 10,6% do PIB de abril de 1989, numa série estatística que começa em 1988.

O volume de crédito em relação ao PIB é uma evidência tranquilizadora, mas, para afirmar com certeza que não estão sendo criados desequilíbrios, o indicador adequado é a evolução dos preços dos imóveis. A regra de ouro diz que, se as moradias estão ficando mais caras do que outros bens e serviços medidos pelos índices de inflação, estamos diante de uma bolha.

"Não há uma base estatística sólida e abrangente sobre os preços dos imóveis no Brasil", afirma o economista-chefe do Secovi-SP, Celso Petrucci . "Temos apenas alguns dados parciais."

Há algumas evidências de que, aqui e ali, os preços andaram subindo, mas não dá para extrapolar essa conclusão para o mercado todo. Em Brasília, por exemplo, os preços dos imóveis anunciados no Plano Piloto praticamente dobraram desde 2005 . Mas esse é um mercado muito particular, em que a oferta de terrenos é restrita, e a demanda, forte, em função dos expressivos aumentos salariais concedidos ao funcionalismo público no governo Lula. Em algumas áreas de São Paulo, os preços estão em alta. No primeiro quadrimestre, imóveis novos nos bairros do Tatuapé, Perdizes ou Penha custavam em média entre 33% e 62% mais do que no mesmo período de 2008. Mas os preços caíram no Morumbi, Limão e Pirituba.

O Secovi-SP acompanha, há cerca de 20 anos, os preços dos lançamentos de imóveis residenciais em São Paulo. Em todo o país, há 15 pesquisas do gênero, mas que não são diretamente comparáveis, porque usam metodologias diferentes. Em geral, a base dessas pesquisas se restringe apenas aos imóveis novos. Sabe-se, pela experiência nos Estados Unidos e países da Europa, que para cada imóvel novo, entre seis e sete usados são vendidos. A prática internacional é coletar os preços nos cartórios de registros de imóveis. A partir desse conjunto de dados esparsos, a avaliação de Petrucci é que, no Brasil, os preços de imóveis têm acompanhado os índices de custo de vida.

A falta de referência segura sobre os preços dos imóveis foi uma das causas dos desequilíbrios surgidos no crédito imobiliário antes do Plano Real, em 1994. As regras prudenciais do BC determinavam que os bancos atualizassem as garantias dos empréstimos imobiliários, ou seja, os próprios imóveis, com base no índice de correção dos contratos - em geral, um indexador, como a taxa referencial (TR). Na época da inflação alta, porém, os indexadores superavaliavam os preços dos imóveis. Quando os mutuários deixaram de pagar seus financiamentos, as garantias se mostraram insuficientes para cobrir o financiamento. Esse conflito obrigou o Tesouro a fazer a capitalização da Caixa Econômica Federal, em 2001. Bancos privados ainda carregam alguns problemas menores que datam dessa época.

De lá para cá, nada mudou nas regras prudenciais: o valor dos imóveis continua corrigido pela TR. Com inflação e juros menores, as indicações são que não há desequilíbrios. Mas essa é a avaliação qualitativa. Ninguém sabe, exatamente, quanto valem os imóveis que lastreiam os balanços dos bancos.

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