quarta-feira, 15 de julho de 2009

Mercado reaquece e companhias batem recorde de vendas até junho

Valor Econômico, Daniela D'Ambrosio, 15/jul

No primeiro semestre do ano passado, o setor imobiliário vivia uma de suas melhores fases. A bonança, porém, foi bruscamente interrompida pela crise global. Um ano mais tarde e o mercado surpreende-se com a reviravolta: as vendas não só se recuperaram, como superaram com folga um período aquecido. O programa habitacional popular do governo e a queda dos juros delineiam uma nova trajetória para o setor, de maneira mais evidente na baixa renda, mas também com recuperação significativa entre as classes média e média alta e em imóveis comerciais.

As prévias das vendas e lançamentos das empresas de capital aberto e a velocidade de vendas das companhias fechadas aponta um novo fôlego para o setor entre abril e junho. A mineira MRV, que atua no segmento de baixa renda há 30 anos, conseguiu o melhor desempenho de sua história, o que a coloca em um novo patamar de vendas. Sai de R$208 milhões de vendas em 2006 e as projeções é de que feche este ano entre R$2,4bilhões e R$2,9 bilhões.

No segundo trimestre, a empresa vendeu R$850 milhões, com crescimento de 77% sobre igual trimestre de 2008, que já havia sido recorde. Sobre o primeiro trimestre deste ano, quando negociou R$430 milhões, a alta atinge 97,6%. "Devemos vender este ano de 25 mil a 30 mil unidades, depois de termos vendido 15 mil no ano passado", afirma Rubens Menin, presidente da companhia. "Estamos mais perto das mexicanas Homex e Urbex e devemos passar este ano as americanas Lennar e Cetex", acredita ele.

A MRV - que aumentou em 50% sua projeção de vendas - foi a primeira a voltar para a Bolsa depois que o mercado acionário melhorou. A empresa captou R$ 600 milhões na oferta pública ao preço de R$24,50, muito próximo dos R$25,00, preço da ação no dia anterior. Segundo Menin, o investidor estrangeiro está confiante no Brasil e no segmento de baixa renda, mas muito atento à qualidade e à trajetória de cada empresa.

Desde o anúncio do plano, o segundo trimestre foi considerado decisivo para mostrar o efeito do "Minha Casa, Minha Vida" sobre as empresas que atuam na baixa renda. Do total vendido pela MRV, pouco mais de 80% foi dentro do pacote. Segundo Menin, a MRV já se vinha preparando para crescer há cerca de três anos e agora, com produtos na prateleira, está conseguindo sair na frente. "Já fazemos o dever de casa, investindo em áreas como tecnologia e engenharia, há pelo menos três anos", diz. Logo que o governo anunciou o pacote, a empresa já encaminhou à Caixa Econômica Federal os projetos e futuros lançamentos que se poderiam enquadrar no programa.

Ela não está só. Empresas fechadas, com experiência na baixa renda, também alcançam bons resultados. A Cury, joint venture com a Cyrela, havia feito um lançamento em São Miguel Paulista de preço médio de R$120 mil em fevereiro, que levou 45 dias para ser vendido. Há cerca de duas semanas, lançou a segunda fase, com imóveis na faixa de R$90 mil, e vendeu as 252 unidades em apenas dez dias. "Esse é o novo ritmo do mercado, por conta dos subsídios do governo", afirma Fábio Cury. "Não vendemos mais, porque não tínhamos produtos aprovados", afirma, acrescentando que o crescimento expressivo da companhia deve acontecer no segundo semestre, quando haverá cinco lançamentos.

De acordo com o presidente do Secovi, João Crestana, a Caixa Econômica Federal está com 600 empreendimentos em análise - que representam cerca de 100 mil unidades - e 100 aprovados dentro do pacote, o equivalente a 10 mil unidades. "Os cem primeiros dias do pacote mostram uma mudança importante no setor", comenta Crestana.

Apesar do aumento das vendas sobre o ano passado, a atitude das empresas mudou muito em relação ao primeiro semestre de 2008. As empresas estão mais cautelosas nos lançamentos - que cresceram numa proporção menor que as vendas. O setor está mais racional na compra de terrenos e na hora de colocar novos produtos no mercado. Isso significa que as empresas estão conseguindo desovar estoques - um dos maiores problemas do final do ano passado.

Na Even, por exemplo, as vendas de estoque evoluíram de forma significativa no segundo trimestre, passando de R$29 milhões em abril para R$83,4 milhões em junho. No final do ano passado, a Cury tinha R$37 milhões em estoques e agora tem pouco menos de R$10 milhões.

Mas a recuperação não se limita aos imóveis para a baixa renda. O aumento do limite do SFH, de R$350 mil para R$500 mil, medida inclusa no pacote, repercutiu nas vendas para a classe média. Do total dos estoques vendidos pela Even, 82% estão em imóveis no médio, médio alto e alto padrão.

A Eztec, que também atua nesse mercado e no de imóveis comerciais de pequeno porte, apresentou aumento expressivo de 70,6% sobre o desempenho do segundo trimestre de 2008. As vendas contratadas no trimestre encerrado em junho atingiram R$243,5 milhões. O montante comercializado até junho já representa 87,5% do total que foi vendido em todo o ano de 2008. "No mercado residencial houve um efeito psicológico fundamentado pelo "Minha Casa, Minha Vida", diz Emilio Fugazza, diretor de relações com investidores da Eztec. "E a queda dos juros favoreceu a venda de imóveis comerciais como alternativa de renda." Dos R$243 milhões vendidos pela empresa, cerca de R$200 milhões foram de um empreendimento de salas comerciais.

A Brookfield, antiga Brascan, que atua nos segmentos comercial e residencial e que foi a primeira a revelar os números preliminares, vendeu R$568,5 milhões de abril a junho, alta de 77% comparado a um ano atrás. Outras empresas divulgarão prévia de resultado nos próximos dias e os números deverão vir na mesma direção.

Investidor estrangeiro retoma interesse pelo Brasil

O mineiro Rubens Menin, presidente da MRV, e Leonardo Correa, diretor de relações com investidores da companhia, passaram dez dias em um road show entre Brasil, Paris, Amsterdã, Londres e Estados Unidos. Estavam lá para reapresentar a empresa a investidores e captar dinheiro para bancar o crescimento esperado para este ano. Em 2008, a companhia vendeu cerca de R$1,5 bilhão e, para este ano, a previsão é ficar entre R$2,4 bilhões e R$2,9 bilhões.

Em um almoço em Nova York, esperavam entre 30 e 40 investidores. Apareceram 80. Ao final da oferta pública, conseguiram captar R$600 milhões. Menin e Correa contam que os investidores estrangeiros e brasileiros estão de olhos atentos ao setor imobiliário no Brasil, mas também estão muito mais cautelosos do que na primeira rodada de abertura de capital das empresas, entre 2006 e 2007.

"Mudou completamente. Os investidores já chegam com a lição de casa feita, sabendo todos os números da empresa e fazem uma análise aprofundada", afirma Menin. "Não tem nada a ver com a fase eufórica do IPO", diz. "Eles querem entender detalhes do plano do governo, por exemplo."

O interesse dos investidores estrangeiros foi discutida ontem em seminário do Citiscape, que reuniu vários executivos do setor. "Todo mundo quer estar no Brasil, o investidor estrangeiro está olhando para cá e deve começar a reinvestir em 2010", afirma Helmut Fladt, diretor do Pátria Investimentos. "O país passou pelo teste de stress e saiu mais maduro e profissional", diz Felipe Cavalcante, presidente da Adit, empresa nordestina que trabalha com investidores estrangeiros.

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